quinta-feira, 4 de julho de 2024

O Céu de Garanhuns


Pedro Jorge S. Valença*

Acredito que foi um pesadelo, pois sonhei que estava entrando no Céu e o Anjo Gabriel  me conduziu a São Pedro, que era risonho, apesar de possuir aquela longa barba. Depois de consultar um grande livro, ficou surpreso e afirmou que não era a minha hora de morrer e que  voltasse imediatamente para a terra. Antes recomendou que tivesse cuidado para não escorregar na descida. Escolhendo o melhor local fui passando pelos diversos Céus e segui direto para o de Garanhuns, que era dividido em diversos locais, seguindo a preferência dos seus habitantes.

No Céu dos Políticos, reconheci Aloísio Pinto, Figueira, Luiz Guerra e Souto Dourado juntos com Elpídio Branco, no maior papo com Zé Batatinha e fiquei convencido que lá não existe PSD e UDN. Noutra reunião Othoniel, Uzai, Dão e outros vereadores conversavam com Vavá Morais. Foi quando Antônio Adeildo se destacou afirmando: "deixa comigo que eu ensino a melhor descida".

No Céu dos Produtores de Leite, ninguém falava em prejuízo onde Lola Branco, Jorge Branco e Lula Branco, sentados em suas redes estavam cercados de vários criadores, que ouviam o relato de Haroldo Amaral e Lolô Vaz afirmando que só um milagre salvaria a Palma Forrageira da praga da Cochonilha do Carmim que atacava em todo Pernambuco. Enquanto do lado de fora Antônio Miranda organizava mais uma corrida dos leiteiros de São Pedro, dentro de casa animadamente sentados numa grande mesa, tomavam café: Seu Vespa, Antônio Cambota, Zé Lins, João Joaquim e Vieira que eram servidos por Olga, Pastora e Celina. Foi quando avistei uma bela Senhora distribuindo pão e leite para uma porção de meninos. A Senhora me abençoou. Então chorei e prossegui com saudades.

Num campo de futebol, quatro técnicos: José Cordeiro, Mestre Abílio, Júlio Paliado e Mestre Amaro, que instruíam uma rapaziada que esperava por Valdemar de Chico Magro para apitar o treino. Entre os jogadores, tinha um ponta esquerda que  chutava muito forte, era Ozéas o terror dos goleiros, que reclamava aos brados, de Timóteo, que falava mais do que jogava.

Numa oficina Zé Cowboy e Luís Preto tentavam consertar o caminhão de Sebastião Branco que sentado conversava animadamente com João Valença. Dobrando uma esquina reconheci uma rua  que era igual a do São Francisco, sem os montes de madeiras espalhados. Lá reconheci todas as donas de pensão, que vestidas de branco, plantavam lindas rosas. Foi quando o Anjo Rafael afirmou: estão aqui, porque Deus olhou para os seus sofrimentos, quando tinham de tolerar uns bêbados chatos e gastar com seus gigolôs. Lembrou que Jesus Cristo, protegendo uma pecadora, mandou que os verdadeiramente puros sacudissem a primeira pedra...

Encontrei com Humberto Valença, comentando que chegou a abrir uma Farmácia, esquecendo que no Céu ninguém fica doente e a transformou numa Casa de Chá, onde um grupo de amigos se reúne para o bate papo. Numa piscina olímpica meus colegas de infância: Alfredinho, João Galindo e Geraldo Jatobá, que morreram afogados, nadavam alegremente.

Em um grande prédio, cópia do Colégio Diocesano, Elias Laporte e Djalma Pimentel, aguardavam para falar com as Professoras: Elzira, Izaura e Lourdinha Moraes que, reunidas com Dona Almira, planejavam um café com mungunzá feito por Dona Alódia e que seria servido por Joaquim Guerra. De costas um Padre atendia a uma imensa fila onde  identifiquei:  Lula Moraes, Edival Monteiro e Nivaldo Lúcio.  Como era Manoel Lustosa que organizava a chegada, fiquei certo que eram ex-alunos do Ginásio que aguardavam para agradecer ao Padre. Até no Céu seus habitantes são gratos.

Num grande salão Dom Expedito reunido com Monselhor Callou, Padre Tarcísio e Dom Jerônimo, estudavam um pedido de Dom Milton Correia para fundar uma comissão semelhante a da Codeam. Ao lado Pe. Godoi mostrava ao Pe. Emilio Lins a letra do seu mais novo hino.

Numa banca de revista estava destacado um Jornal, com um artigo de Humberto de Moraes, ao lado ficava um alto falante, onde identifiquei as vozes de Humberto Granja, Mauricio Acioli, Ivo de Souza e Aluízio Alves que liam um noticiário e Manoel Teles que cantava a música Granada. Num bar de primeira classe, fui chamado por Orlando Paulino, Turrica e Borborema, para "abrir o apetite". Foi que fiquei consciente que "tomar umas e outras" não é pecado. E sai mais animado. Um toque de corneta que identifiquei com "reunião de oficiais", deixou-me curioso e me deparei com Eriberto com farda de Coronel, comandando um Batalhão de Anjos. Então conclui que Deus escreve certo por linhas tortas.

Já na saída me deparei com um jardim coberto de lindas flores e fui surpreendido quando meu primo e compadre Eronides Silvestre, explicava a um grupo de Anjos que tudo aquilo se devia ao apoio de Dona Arlinda. Foi quando acordei tranquilo, pois fiquei certo que deixei uma vaga lá em cima e que vou demorar a fazer essa viagem verdadeiramente.

*Escritor, economista e agropecuarista. 

Foto: Cristo no Alto do Magano, Garanhuns.

Créditos da foto: mapio.net

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