terça-feira, 1 de agosto de 2023

A Personalidade profunda


Dr. Aurélio Muniz Freire*

Cada um de nós é algo bem mais profundo do que apressadamente imaginamos. Fugindo um pouco de afirmações dogmáticas, intransigentes ou irracionais, derivam elas de intolerâncias religiosas ou científicas e, fazendo uma parada em você mesmo, pergunte-se: quem sou eu? Se você se aprofunda no desafio da pergunta, pouco a pouco vai se sentindo estranho a si mesmo, como se você fosse um grande enigma individual. Esta questão torna-se profunda para mim, para você, para todos nós, notadamente quando a psicologia tradicional ou acadêmica, aborda tão apenas o convencional, cuidando de aspectos superficiais da conduta, do comportamento, das emoções humanas, sem um mergulho de  profundidade no cerne da criatura humana.

A medida em que descemos ou subimos na indagação (quem sou eu?... quem é você?...), vamos reconhecendo que o nosso nome é apenas uma vestimenta a identificar traços da nossa personalidade. É apenas um rótulo que nos assinala, que nos marca em nossas vidas. Se, em verdade, conseguimos analisar o conteúdo íntimo daquela pergunta, descobrimos que, sendo o nosso nome tão somente uma legenda a identificar a criatura que somos, ressalta o fato de sermos uma realidade bem mais significativa que o nosso apelido.

Frequentemente estamos, por um processo inconsciente, aceitando aquela outra realidade que em nós reside, verdadeira causa de tudo quando temos ou possuímos. Exemplifiquemos. Quando dizemos: meu cérebro minha audição, meu tato, meu coração, minha inteligência, minha vontade, minhas emoções, estamos de tal modo, implicitamente reconhecendo um algo mais em nós, que  não sendo nem o nosso corpo, nem as nossas emoções, nem as nossas faculdades superiores, está possuindo, dominando, regendo tudo quanto temos, tudo quanto secundariamente somos. Daí, frente a este exemplo tão simples e tão corriqueiro em nossas vidas, podemos lançar uma outra pergunta. Quem é este ser enigmático que em mim se esconde e é possuidor não apenas de minha constituição física, mas ainda de todas as minhas características psicológicas?

Muitas filosofias existem que nos conduzem através de seus métodos à demonstração daquele ser, daquela realidade profunda que somos nós. A antiga Ordem Rosacruz, na sabedoria milenar de seus ensinamentos, numa de suas práticas, orienta-nos à descoberta do verdadeiro EU. Havendo, para tal mister, seriedade de propósitos, aquela experiência demonstra uma outra personalidade a dominar tudo quanto superficialmente apresentamos ou parecemos ser.  A Yoga, também filosofia respeitável, originária das tradições antiquíssimas e sábias do espiritismo hindu, igualmente evidencia por exercícios, a personalidade invisível, desconhecida de cada um de nós. Sem qualquer deslustre, sem qualquer propósito de minimizar a grandiosidade de tais sistemas, respeitáveis na esteira milenar dos séculos, pretendemos, contudo, filosofar um pouco, racionalizando alguns aspectos que dizem respeito à verdadeira personalidade humana.

Desde que sejamos espiritualistas, não importando as nossas denominações filosóficas ou religiosas, aceitamos um  princípio que anima, que vitaliza o nosso corpo e a este sobrevive. É a alma ou espírito. Todavia, nem sempre pensamos de modo sério, profundo sobre tal afirmação. Quase sempre assim pensamos ou dizemos (que temos uma alma, um espírito, um Eu superior, mente, etc.), escudados pela tradição, pela educação doméstica recebida, pelos ensinamentos rotineiro e superficialmente repetidos nas  escolas, nos lares, nas religiões. Nossa fé (às vezes vazia, irracional), nossa religião, nossa crenças, nossa educação, enfim, mandaram que assim aceitássemos. Tudo isso nos formou e nos educou, afirmando-se que "temos" uma alma, um espírito. E assim,  prosseguimos afirmando as mesmas coisas, fazendo-o maquinalmente, sem convicção, num estado mais de dúvidas que de certezas. É como se disséssemos: eu creio, eu acho que isto é verdade... Mas... talvez não seja. E assim ficamos num estado de vacilações, diante de uma fé irracional, dúbia, vacilante.

*Jurista e escritor / Garanhuns, 4 de janeiro de 1986.

Créditos da foto: Anchieta Gueiros.

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