sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Crônica da poesia 'Soletrando um soneto de Dirceu Rabelo'


João Marques* | Garanhuns

Poesia é um instante, um pedacinho da eternidade que o poeta tem, por antecipação, para alcançar o belo. Mas impossível é definir a poesia, o belo, o estro, que são do domínio das coisas divinas. Sem nenhuma conotação religiosa, são dois domínios superiores. O poeta Dirceu Rabelo tem desses instantes da poesia maior.

Recebi e li há pouco tempo o jornal, em forma de revista, APL em Poesia & Prosa. O jornal todo apresenta 15 poetas vivos, da Academia Pernambucana de Letras. E, entre os 29 poemas publicados, O PLUVIAL IV (Soneto Subjuntivo), de Dirceu Rabelo. É um desses poemas que não se leem uma vez só. Li reiteradas vezes, e passo a soletrar, aqui, o engenho de um poeta ilustre na 'gestação' de um soneto iluminado. A poesia:

Seja de chuva o dia , a brisa, mansa,

penetre pelas frinchas das janelas;

e as folhas cumprimentem-se naquelas 

verdes ondulações de afago  dança.


Essa motivação natural faça

que em palavras a ideia se organize

e o verso inaugural flua e deslize,

tal como pingo d'agua na vidraça.


Toda essência do verso se refine;

e alguma luz inesperada adentre

na inspiração do poeta e o ilumine.


Organizada, a ideia se concentre;

E nesse instante a gestação termine;

e o soneto liberte-se do ventre.

A Concepção, a Gestação e a Entrega. A criação do poeta se dá com essas três fases. Na Concepção e nas outras fases, consciência e trabalho são muito rápidos. Instantaneamente, isso começa  a acontecer nos versos do primeiro quarteto. Quando o poeta percebe a chuva, a brisa mansa penetrando pela janela e as folhas de fora ondulada, é a imediata concepção. Aí, é tudo, ou é quase tudo. Entra o poder do estro, da mão mágica, e eles fluem e deslizam pelo papel, também, igual ao pingo d'agua na vidraça. Que maravilha!

Iluminado o poeta, com 'toda essência', ideia organizada, ele gesta a poesia, usando o signo da palavra. Atende à formalidade do método, e, vitorioso,  afirma:

"E nesse instante a gestação termine;

e o soneto liberte-se do ventre."

Abençoado ventre, abençoado fruto. O que sai, lídimo, das mãos hábeis e se mostra grande. E é comparável aos clássicos e maiores sonetos, dos vates sagrados da Literatura do mundo. Poesia é um instante, um pedacinho da eternidade... Parabéns, Academia Pernambucana de Letras.

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