quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Um lugar chamado flores

João Marques dos Santos



João Marques* | Garanhuns

Bem ao norte de onde nasço às 4 horas da manhã, num sítio rodeado de mato e de coisas encantadas, existe Flores distante, de mais encantos. As notícias de Flores, enquanto cresço, são fascinantes. E, quando é pelas notícias, eu imagino Flores como o paraíso de que tive também notícias depois. Mas só que este lugar aqui ao norte não tem pecado. As maças são saudáveis para todos, não há proibições e as serpentes não falam e nem têm veneno nas palavras. Em Flores ninguém é mordido de cobra. Os homens têm suas origens nos talos e as mulheres nas pétalas macias. Em verdade, não foi criada a árvore genealógica, do bem e do mal. De flores nunca saiu o destino humano de condenação, que tivesse sido tirado à natureza, da flora e da fauna.

Em Flores, tudo é natural e simples. Vida campestre e meios elementares de sobrevivência. Como no meu sítio, de trabalho e de costumes agrícolas. Os homens vêm caminhando, no final da tarde, com as enxadas de cabos compridos às costas, e rostos nédios de suor. Vêm em fila andando lentamente. Os passos mal se movem, e o sol pouco a pouco descansa atrás dos montes longínquos. Em casa, de  volta, a ceia quente servida sobre a grande mesa, de toalha estampada de vermelho. E comem lentamente ainda, e falam do que fazem, e do gado, e das chuvas, e da fase da lua cheia. Os caminhos surgem por onde passam, igual os riachos e os grandes rios, que são determinados por onde as águas escorrem. E há mais caminhos, quanto mais pessoas em Flores, e necessidade de trabalho, de visitas, e de uma vida cheia de alegria e de lugares no chão, para se pisar com liberdade.

Outras vezes, imagino Flores perdida no tempo, um clã de pessoas amáveis, em harmonia de uns com os outros. Os mais velhos são amparados por todos e são seguidos os seus ensinamentos. Flores, aí, por merecimentos da vida, tem as árvores mais antigas. As Flores e as folhas não murcham. Elas resplandecem as luzes das estrelas e, assim as noites deste luar bonito não são totalmente escuras. Flores, ao norte, existe entre a minha realidade e  a minha fantasia. É a vida! (Jornal O Século, 2016).

*João Marques dos Santos, natural de Garanhuns, onde sempre residiu, é poeta, contista, cronista e compositor.  Teve diversas funções nas atividades culturais da cidade: foi Presidente da Academia de Letras de Garanhuns, durante 18 anos, Diretor de Cultura do Município e, atualmente, é presidente da Academia dos Amigos de Garanhuns - AMIGA. Compôs, letra e música, o Hino de Garanhuns. Mantém, desde 1995, o jornal de cultura O Século. Publicou quatro livros de poesia: Temas de Garanhuns, Partições do Silêncio, Messes do azul e Barro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O político e as raízes de Souto Filho

Gerusa Souto Malheiros* Do poder, meu pai não sentiu jamais o desvario, nem o considerou um bem de raiz. Da sua tolerância, da moderação e d...