sábado, 19 de agosto de 2023

Minha Mãe Serafina

Garanhuns, antiga Rua 15 de Novembro

[Garanhuns] - Com a morte de minha mãe, terminava tudo de bom que existia na minha vida. Até a esperança mudou de cor. Sentia-me sem coragem moral de uma reabilitação. Os dias tornaram-se tristes e sombrios como se fossem eternamente nublados. Era o inverno que dominava todos os recantos do meu ser. Não podia alcançar que a fatalidade biológica fosse tão contundente. Que o ser que me deu a vida material morresse ao meu lado. Fechasse os seus olhos fitos para mim.

Neste estado de espírito, o inconformismo não me  deixava entender melhor. Essa falta de entendimento pela ausência física de minha mãe, foi muito cruel. Envelheci muitos anos em alguns dias. A vida é assim, quebra os homens, sem barulho, sem gritos, sem soluções. Quase que não se percebe. Representa muitos dramas e sofrimentos. As dores do mundo eram só minhas. Ninguém partilhava do meu sofrimento. Era único, para mim, em toda a sua extensão. Seria assim mesmo. Ou estava apenas inseguro... Para mim seria óbvio, o absurdo de que o mundo dos meus  pensamentos deveria parar. Deveria haver no tempo uma parada cardíaca. Tudo deveria começar de novo. Voltar a ser criança. A criança da Rua 15 de Novembro, a correr de pés descalços para  assistir a partida do trem das nove. Para logo após ver a pose de "Seu Gracindo" sentado no primeiro banco do trole, correndo nos trilhos da estrada de  ferro. No meu conceito infantil Seu Gracindo era o maior homem do mundo. Minha velha mãe me perguntou: "meu filho quando você crescer o que é que você quer ser"? A resposta veio pronta "quero ser "Seu Gracindo". Tudo isto partiu e me deixou interiormente vazio. Esse isolamento  me proporcionou angústia.

Tentei me situar com as minhas lembranças, a minha mãe não era simples imagem representada sem está presente. É muito mais do que apenas um retrato de memória. A mãe é um exemplo vivo, permanente e consolador do quanto pode realizar, o coração que  se doa por inteiro ao milagre biológico do mistério da natividade. Nesse  sentido, os princípios são os  mesmos por toda parte. Sua vida por mais avançada, por mais longa que seja, é sempre uma vitória... Para os filhos: preparados e inteligentes, analfabetos ou sábios, existe sempre o complexo de Édipo. Sua vida é um instante de vibração superior. Se a época é de  dores, o regaço materno é  o refúgio. Com a pequena lamparina do amor irradiante que se consegue acender em nosso espírito - de repente se descobre, algo, perplexo, a lamparina com a sua tímida luzinha, vira estrela em nossa mão. Por mais duros que sejam os compromissos; por  mais tristes os dias, nunca serão riscados de sua vida. Seja qual for o comportamento das mães, elas são sempre virtuosas porque são um comportamento da virtude. O amor materno é uma afirmação incondicional da vida do filho e de suas necessidades. Ela está, ocupando, como sempre, todos os espaços dentre de mim. As dimensões das minhas possibilidades não afirmam o instante de  sua grandeza moral. Por isso tudo quanto sou e tenho feito não alcançam o valor real conquistado pela  fé. O perfil de minha mãe rezando. Ela me ensinou que a oração é o suspiro da alma, pelo qual a mente humana se sujeita é restauradora Mente Divina.

Os nosso sofrimentos vem dos nosso desejos fáceis. Assim é a vida... Os homens gritam, se cansam e se acalmam... Descansam e começam a gritar... Medo de crer, a fé cria obrigações. Estes homens não são alegres e nem tristes. Aprenderam a filosofar, porque somente filosofando eles mentem menos. Pois nesta ocupação, tão gloriosa como benemérita, o homem não faz senão inventar. Entre a mãe que é perfeita intuição e o seu  filho que é filosofo, médico, escritor, poeta, jornalista, há um tremendo choque de  cultura. A gente usa uma porção de palavras simplesmente por costumes. Sem pensar no que está escondidas atrás delas... A vida... Minha vida. Estas palavras estão cheias de que? Estão cheias de muitas coisas que os livros não ensinam.

Eu confesso: nunca pronunciei (a não ser quando uso os termos que minha mãe me ensinou), uma única palavra original. Juntando as minhas mãos às suas me fazia sentir o contato de outra dimensão da vida. A oração como elemento estabilizador da vida transformou notavelmente meu comportamento psicológico.

No dia consagrado às mães, que deverá ser todos da cronologia humana, quero afirmar como gratidão que minha mãe SERAFINA FRANCISCA DE FONTES - foi ponte suspensa entre dois mundos vibratórios. E soube cumprir fielmente a sua missão enquanto viveu neste mundo de provas. A sua vida foi  pontilhada de luz. E essa  luz continua iluminando todos os caminhos da minha vida. Porque não existe cruz que não se faça escada. Nem angústia que não seja transformada em vivas e fagueiras esperanças.

Dr. José Francisco de Souza / Advogado, jornalista e historiador / Garanhuns, 17 de Maio de 1980.

Foto: Garanhuns, antiga Rua 15 de Novembro.

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