Quero ser um papagaio de papel, neste domingo que inicia o desfile do sempre preocupante mês de agosto. Tenho grave urgência disso!
Subirei bem alto, compondo-me em múltiplos movimentos. Juntarei coisas assim, aparentemente díspares: um retrato de minha primeira comunhão, alguns poemas que entretanto ainda não escrevi, o nome escrito da inutilidade amada, a música "Piano", de Bruno Carezza ("Jogo da Vida"), mais uma balada de Chopin e algumas folhas do meu tranquilo lambeiro. Coisas desse tipo, só na aparência loucamente díspares. Irreconciliáveis pedaços meus. Tudo isso acrescentarei à cauda do improvisado papagaio de papel que, de repente, devo ser, nestes primeiros instantes de agosto. Até que chegue o dia 13 de (sexta-feira), e haja uma implosão em orla marítima: um veleiro que afunda.
Me empinarei todo então, hoje, ao vento de Candeias. Perderei a condição de humano terrestre: serei alado. Quero, desesperadamente, seu um papagaio de papel. Não me impeçam com inúteis súplicas de olhos!
Não, não me esperem, neste dia: serei apenas um papagaio de papel, meus braços e pernas transformados em varas de bambu, como imagens de Kafka. Flutuarei, irregular e dúbio, sobre o azul do céu para assim fugir ao cinzento dos meus controvertidos mundos interiores.
Serei, neste domingo que abre agosto, um papagaio de papel. Tentarei driblar o mês dos maus presságios, até que setembro venha, tépido de sol, para me cobrir o rosto e inscrever, em minha testa, uma palavra de esperança e fé.
(Alguém, em terra, controlará o carretel de linha que me manterá no ar, em evoluções. A linha não se partirá, ah! nunca como uma frágil amizade! Suas mãos de unhas cor de rosa controlarão o meu oscilar de papel e, quando Candeias adormecer, me recolherão, com úmidos e lânguidos olhos de adolescida garça. Assim como quem recebe aquele que, cansado, retorna de ter flutuado no azulecido céu que hospedou a caminhante tarde).
Permitam-me ó todos os incrédulos - que hoje seja eu simplesmente um papagaio de papel e que o vento assovie, aos meus ouvidos, o "Piano", de Bruno Carezza, e aquela balada de Chopin, que costuma preludiar o meu ato de adormecer e reconstruir os sonhos que o real da vida me estilhaçou!
*Waldimir Maia Leite | Jornalista, escritor e cronista | Recife 1985.
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