terça-feira, 1 de agosto de 2023

Dr. José Mariano

Dr. José Mariano
José Mariano Carneiro da Cunha era filho legítimo do tenente-coronel Mariano Xavier Carneiro da Cunha, de tradicional família pernambucana. Nasceu em 8 de agosto de 1850, no engenho Caxangá que pertenceu ao município de Gameleira, hoje situado no de Ribeirão, cujo território foi desmembrado daquele em 1929. Ao engenho aludido, transformado depois em usina, fica anexo o povoado do mesmo nome o qual já  elevado a vila e sede do 3º distrito municipal, teve em 1938 a denominação substituída para José Mariano, como homenagem póstuma ao seu eminente filho.

Matriculando-se, José Mariano, aos 16 anos de idade, na Faculdade de Direito do Recife, formou-se em 1870, tendo por companheiros de turma, entre outros, os Drs. Joaquim Nabuco, Ulisses Viana, Sancho de Barros Pimentel, Herculano Bandeira, José Marcelino de Souza, os quais tiveram posição proeminente na vida pública: o primeiro,  notável diplomata e  abolicionista excelso, os demais presidentes de províncias e  governadores, os dois últimos dos Estados de Pernambuco e da Bahia.

Filiando-se ao Partido Liberal, o nóvel bacharel fundava, em 1872, A Província, como órgão do partido, redatoriada por intelectuais e políticos do quilate de Epaminondas de Melo, Ulisses Viana, Aprígio Guimarães, Costa Ribeiro, Maximiano Lopes Machado.

Homem público, dispondo de sólida influência, foi,  reiterada vezes, deputado no regime monárquico, ingressando no  Congresso Federal na 1ª representação de 1891 a 1894.

Ainda no Império, já consagrado tribuno, distinguiu-se como propagandista ardoroso das ideias liberais "com a alma insuflada nas lições de civismo e o calor do famoso Frei Caneca", igualmente retemperada no liberalismo acrisolado de Epaminondas de Melo, seu companheiro, mestre e amigo.

José Mariano, no dizer de um seu biógrafo, era a reminiscência e ressureição do legendário Nunes Machado, esse tribuno cujo verbo arrastava a onda popular, sendo ao mesmo tempo protótipo de homem de bem, intrépido e abnegado.

Nabuco, o denodado combatente abolicionista, qualificou José mariano de chefe local do abolicionismo e o mais popular dos pernambucanos vivos.

Em artigo, o escritor Câmara Cascudo diz que o valoroso democrata governou, quase meio século, a popularidade do Recife.

No Teatro Santa Isabel, o maior palco tribunício de Pernambuco, ressoou muitas vezes, sob delirantes aplausos, a voz do grande orador. No tradicional teatro realizou, em 1896, uma  de suas últimas conferências, recebendo estrondosas aclamações.

Companheiro de João Ramos na atuação do legendário "Clube dos Cupins", que tinha por lema destruir sem rumor, cujo significado não era outro: dar escapula aos escravos, libertando-os clandestinamente do jugo do senhorio. Dedicada auxiliar do esposo, D. Olegário Gama Carneiro da Cunha teve parte saliente na humanitária cruzada. Alma boa e caritativa, D. Olegarinha era chamada a mãe do povo

Também participou da campanha emancipadora com bastante relevo, D.  Leonor Porto, outro coração abnegado e infatigável lutadora a prol da causa que devotamente abraçou.

No solar de José mariano, no Poço da Panela - fato digno de registro - recolhera-se 70 escravos fugitivos, os quais, não obstante a vigilância policial, escaparam-se, alta noite, pelos fundos da casa, à margem do Capibaribe, daí embarcando todos para o Ceará, província no momento já libertada cruel escravidão. Os foragidos foram recrutados nas senzalas do Barão de Muribeca (Dr. Manuel Francisco de Paula  Cavalcanti de Albuquerque).

No ano de 1870, José Mariano foi eleito, em disputa memorável, deputado pelo 2º distrito ao mesmo tempo que o seu  irmão na crença política, Nabuco, o era pelo 1º distrito, enfrentando o conselheiro Machado Portela e, em seguida, pelo 5º após a anulação de pleito anterior. Oposicionistas à situação Conservadora, venceram ambos de modo espetacular, os candidatos amparados oficialmente, não sem desencanto para os escravocratas.

Vitoriosa a causa da abolição, José Mariano, espírito arraigadamente liberal, no mesmo ano (1888), fez, perante os seus amigos profissão de fé republicana.

Rebentando, no início da República, a revolta da Armada contra a ditadura Floriano Peixoto, o Dr. José Mariano aderiu à mesma, sendo preso e remetido para a Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro, onde curtiu 6 longos meses de prisão.

Mesmo assim, ausente e sob custódia, foi eleito deputado pelo eleitorado recifense com apreciável maioria.

Em 1895, veio ao Estado natal com o fim de colocar uma  grinalda no túmulo do seu amigo e companheiro Dr. José Maria, outro espírito de combatividade tenacíssima, assassinado em um colégio eleitoral do Recife, fato de grande repercussão no Estado, aliás no País. Nesse mesmo ano, o incansável político lançou pela a A Província um repto de honra aos adversários sobre a derrota do Barão de Contendas na eleição de senador federal na qual foi eleito o conselheiro Rosa e Silva. Detinha, então, a chefia do Partido Autonomista, em campo optou ao republicano orientado pelo referido conselheiro. No decurso do ano em referência, deu-se funda divergência no seio do partido, sendo dissidentes o barão de Caiará (Dr. Augusto de Souza leão), Drs. João  de Siqueira, João Elíseo, Francisco Apolônio Jorge, Tomaz de Carvalho e general Colíope de Melo.

No momento do revés curtia o Dr. José Mariano prolongado e fatigante ostracismo.

A despeito da atitude de combate desenvolvida na Concentração (1899-1900), jornal bravamente dirigido pelos Drs. Faelante da Câmara,  Artur Orlando e Gervásio Fioravante, pouco depois pelo Correio do Recife (1903-1910), fundado pelo Barão de Lucena que, já aliado a José Mariano, constituíam forte baluarte partidário - tudo foi improfícuo ante a resistência oposta, depositária de todos os trunfos.

Durante longa fase os partidos tiveram epítetos: a princípio violão e deletério, este lorota quando da aliança Lucena, aquele marreta na queda do rosismo. Para a facção decaída o  apelido adquiria maior ressonância.

No nosso município eram partidários de irrestrita solidariedade à corrente marianista, o major Sátiro Leite, coronéis André Bezerra, Tenório de Carvalho, José Alexandre Correia de Melo, Malaquias Batista, Drs. Caraciolo de Freitas, Antônio Freire, Benjamin Caraciolo, capitães José Cavalcanti de Carvalho, Augusto Caraciolo, Severiano Rodrigues Jatobá, Manuel Rodrigues Galindo, Rufino de Melo e Silva, tabelião Eduardo Antunes de Albuquerque Melo, além de outros elementos também valiosos. Em todas as residências dos adeptos do Dr. José Mariano ostentava-se, aposto, o retrato deste, significado testemunho de dedicação ao chefe.

De 1889 a 1912 esteve o valoroso pernambucano ausente do Parlamento por lhe não ter sido possível voltar ao mesmo dentro do regime eleitoral de então, intitulado do bico de pena. Assim, pois, foi impelido a transferir a residência para a capital da República, onde conseguiu a nomeação de Oficial do Registro de Títulos, cargo vantajosamente rendoso. Exaltado partidário do general Dantas Barreto ao governo do Estado, foi, após a transformação política, eleito para a Câmara Federal, demorando ligeiramente ali, pois a 6 de junho de 1912 falecia no Rio de Janeiro, aos 62 anos de idade. O Cardeal Arcebispo D. Joaquim Arcoverde ministrou-lhe, nos últimos momentos, o conforto da Religião.

No dizer de Sebastião Galvão, conquistara o Dr. José  Mariano entre os seus conterrâneos  o mais intenso prestígio de popularidade e por isso mesmo desapareceu no túmulo coberto de lágrimas e das bênçãos de todos.

A chegada do corpo e inumação no Cemitério de Santo Amaro verificou-se verdadeira apoteose. O cadáver veio embalsamado e os funerais realizaram-se à custa do Estado.

Deixou publicado o seguinte: Discurso pronunciado na  Câmara dos Deputados, 155 páginas, 1880, - Contestação ao conselheiro Teodoro Machado Freire Pereira da Silva e legitimidade do diploma à Assembleia Nacional ao Sr. deputado José Mariano e refutação por este apresentada, 1881. - Carta Política ao eleitorado, 1892. - A Tragédia de Pernambuco (no "Jornal do Commercio", do Rio, 1895) sobre o assassinato do  diretor da "A província", Dr. José Maria de Albuquerque Melo.

Fonte: Texto transcrito do livro Ruas de Pesqueira - Obras Completas Volume 3 | José de Almeida Maciel | Coleção Tempo Municipal | Centro de Estudos de História Municipal.

Créditos da foto: Acervo Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ), FR-01530; fotógrafo: A. Ducasble, Recife.

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