Minha avó era profundamente religiosa. No solar da Av. João de Barros, havia um quarto especialmente dedicado aos Santos
Hermínia Lins era possuidora de extraordinária beleza, e algumas pessoas ainda hoje vivas (1967), e que a conheceram na Colônia, como Armando Vasconcelos, que depois foi meu bedel como aluno na Faculdade de Direito, não se cansava de repetir que era a moça mais bonita que conheceu.
Dela bem me lembro na minha infância. Possuía um gênio autoritário, meio imperialista, com grande poder de atração sobre as pessoas e um especial sentimento de ajuda em favor dos semelhantes. Toda a vida da família se concentrava por assim dizer em derredor de seu foco de atração solar: marido, genros, filhos, netos, parentes e amigos.
Estácio Coimbra, que duas vezes foi o governador de Pernambuco, tinha-lhe uma atenção especial, e um pedido seu era uma ordem. Quando Vice-Presidente da República, vindo ao Recife, foi uma feita homenageado pelo casal no solar da Av. João de Barros.
Lembro-me bem dela na última fase de sua vida, já pelos 50 anos de idade. Era um mulher morena, de olhos castanhos, as linhas do rosto denunciando a grande beleza de sua juventude. Era de uma dedicação extrema para com os netos, e mesmo displicente em reprimir as suas faltas. Cumulava a todos os netos de presentes, e quando viajava para o sul, trazia as malas carregadas de presentes, que distribuía sem regatear e a mancheias pelos seus netos. Todos gostavam dela.
No solar da Av. João de Barros dominava como uma rainha. Sempre havia o que fazer no grande sítio, com suas fruteiras, seu viveiro, seus parentes, a mesa grande para o almoço e para o jantar posta para umas 20 pessoas, a quem meu avô servia como patriarca.
Os dois netos dedicava uma atenção especial: a meu irmão mais velho José e à minha prima Maria Ernestina, a quem criou desde o seu nascimento. Os pais desta, depois da morte da sua primogênita, deram-na para criar, a fim de consolá-la da dor imensa e profunda da morte de sua primeira filha, Sinhá, ocorrido em 1911. Dizem que minha avó ficou um ano alheio ao mundo, desconsolado e triste, sentada numa soleira, distante das coisas.
A morte desta sua filha primogênita, Sinhá, ocorreu em 12 de março de 1911, aos 18 anos. Recém-casada, com um jovem e brilhante juiz, Cunha Melo, que depois foi Ministro do Supremo Tribunal Federal, viajou para o Amazonas, onde o marido servia como juiz federal. De lá voltou doente, e faleceu na Casa-Grande da Av. João de Barros, de bexiga, com um filho no ventre, quase prestes a nascer. A ciência médica de então, o Dr. Gouveia de Barros à frente, especialista famoso e ainda hoje com nome, apesar de todo o seu empenho e dedicação, não pôde salvá-la. A moléstia, lenta e dolorosa, a aniquilou, deixando inconsoláveis o marido e os pais. Foi uma ano doloroso, este de 1911.
Minha avó era profundamente religiosa. No solar da Av. João de Barros, havia um quarto especialmente dedicado aos Santos, o santuário, alguns deste depois guardados por minha mãe. Eça de Queiroz relembra que a mitologia Católica criou cerca de 3.000 Santos. Alguns deste mereciam um culto especial: São José, santo Antônio, sem contar o Menino-Deus e Nossa Senhora.
Por vezes minha avó era madrinha de certas solenidades religiosas, em Boa Viagem, onde costumava veranear durante as férias. Excedia-se então no cálido sentimento religioso de culto dos Santos e na fraternal caridade pata com os pobres.
Tinha assim o seu mundo: nele dominava como uma rainha de beleza e de bondade. (Foi mantida a grafia da época).
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