Agasalhei-me, muitas noites, com fome, fome de verdade, pois o almoço do Macaíba era fraco e, quando, às vezes, queria tirar desforra no pão, o Belarmino, seu proprietário, me advertia dizendo que o almoço só dava direito a um. Quando a miserável da fome (e só quem já passou por ela pode avaliar sua dureza...) me fazia apertar, o cinturão, por não aguentá-la mais botava o pé no mundo: ia, a pé, jantar com o meu querido Soutinho, à rua Joaquim Nabuco, 189, na Capunga. Ou, como várias outras vezes sucedeu: ia "apertar" o jantar do Eliezer (um senhor que pertencia à Igreja Presbiteriana, da rua da Concórdia) preparado por ele próprio quando, já tarde, chegava do trabalho. Algumas vezes a coisa dava certo: o Eliezer me oferecia umas colheradas de feijão e um taco de jabá. Mas, de outras, passei a ficar chuchando... nos dedos.
Felizmente, os tempos foram passando e eu melhorando de vencimentos. Na tramways pasei a ganhar trezentos mil réis. E para poder levar, ainda assim, a coisa adiante, procurei, nas horas de folga, fazer uns "bicos". Consegui a confiança de Manuel Guedes Nogueira, conhecido, em família, por Manjuca. Era um homem abastado, que emprestava dinheiro a juros, juros de "vinagre", Sujeitava-me aos mesmos, pela necessidade de obter capital.
Por me haver sido oferecido melhor colocação, com vencimentos superiores aos da Tramways, fui trabalhar, como caixa no American Mercantil Bank, sito à rua do Bom Jesus, onde hoje está instalada uma agência da VARIG.
A sorte não me estava sendo propícia. É que o banco fechou, logo depois, e eu, novamente, dando de pernas...
Fonte: Memórias Brancas / Elpídio Branco / 1963.
Foto: Elpídio de Noronha Branco.
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