Marcílio Reinaux* | Recife, 10/12/2010
Há poucos dias neste mês de setembro visitou-me o amigo Ivo Amaral. Demos uma caminhada pelo meu bosque e Ivo a meu convite plantou uma árvore. Inspirado, naquele dia, próximo ao começo da primavera, escrevi esta crônica dos "Retalhos do Cotidiano". É dedicada ao amigo Ivo Amaral em agradecimento à visita
Assentado na relva, debruçado em um tronco adormecido, contemplo um espetáculo maravilhoso da natureza. Chegou nestes dias de setembro, a primavera. Sem que nenhum de nós percebesse, ela chegou de mansinho, porém firme, forte e luzidia, mesmo que muitos nem dela se lembrem, nem mesmo possuam jardim para recebê-la. Eu a recebi.
O sol agora dardeja luzes, já marcando sombras diferentes entre as árvores do meu bosque. Ao que parece os habitantes da mata já sentem as diferenças de ontem para hoje. Essas criaturas maravilhosas tão naturais que circulam no ar e pelo chão e relva ao nosso redor continuarão as suas trajetórias, agora mais felizes. E com certeza sentindo que as mudanças da mãe natureza, começam a preparar uma nova vida primaveril.
Parece que ouvimos finos clarins, ou novos cantos de pássaros que antes não voavam por aqui. Parece também que eles se associam a outro mundo confidencial, aquele das raízes, que se movem e se elastecem nas entranhas da terra, rangido tentáculos, ampliando e conquistando seus espaços. Afinal as chuvas invernais que agora cedem lugar à luz da primavera, deixaram há pouco uma herança muito rica do viço do húmus e o alento das plantinhas e das grandes e também frondosas árvores do bosque. As folhagem ainda balouçante com as últimas gotas orvalhadas.
Cecília Meireles nos conta que na primavera, "arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores, em bosques de rododentros que eram verdes e ficarão alguns cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur."
Nesta primavera iniciante, já ouvimos vozes novas de passarinhos, ao que parece ainda surpresos com as mudanças do ciclo do tempo, começam a ensaiar as árias tradicionais das suas próprias canções. Ah! Também vemos com mais intensidade, que pequenas borboletas brancas e amarelas - saídas dos casulos, parece que se apressam pelos ares, conquistando seus espaços na infinitude de um novo mundo. E, também nos deixa a imaginar, que elas conversam, mas tão baixinho que não ouvimos nem entendemos.
O inverno que se foi ou se vai, deixa também traços da vida nas águas da renovação de mundos incomensuráveis. Por entre eles as plantinhas alegres, inauguram suas flores e as árvores anunciam seus frutos. As folhas, flores e frutos e todos os seres viventes, procuram os céus da primavera e comemoram o primeiro raio de sol.
O bosque com as suas árvores cobertas de folhas e flores nos lembram que só os poetas, percebem rápido que ela, a Primavera tal qual uma deusa, chega coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar com a natureza neste renovado mundo de luz. A terra também de sua parte - com a chegada da Primavera - maternalmente se enfeita para as festas da sua perenidade na dança das flores, folhas e frutos e entoa uma nova canção.
Enquanto há primavera, esta primavera natural, escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas veredas e toscas estradas do bosque que ainda conservam nossos sentimentos de amor à natureza e à Primavera. Ela sempre de roupagem nova a cada ano. Por isso brindemos por tudo dos ares primaveris, para deixar brilhar por um instante, apenas que seja, a sua beleza expressa nessa dádiva de Deus. Saudemos a primavera, dona da vida.
*Marcílio Reinaux, à sombra do arvoredo do "Bosque Ebenezer" / Iputinga / Recife.
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